Pink Floyd - Atom Heart Mother (1970)

 

Atom Heart Mother marca um ponto de transição fundamental no som do Pink Floyd, emergindo do seu período mais experimental e psicodélico para algo mais coeso e contido. Esse disco é uma peça valiosa e intrigante na discografia da banda. A faixa-título, por exemplo, é uma verdadeira epopeia sonora de quase 24 minutos, misturando as habilidades instrumentais da banda com uma sofisticada orquestração elaborada por Ron Geesin. Embora muitas bandas tenham adotado a fusão de rock com elementos sinfônicos anos mais tarde, o Pink Floyd foi um dos pioneiros nesse estilo, criando, para alguns, uma obra-prima; para outros, uma tentativa ousada e desnecessária. Mas a verdade é que este é um álbum que pode ser apreciado sem precisar aderir a extremos de adoração ou rejeição.

O disco começa com a faixa-título, um motivo de desconforto para a própria banda, que alega não gostar do resultado. No entanto, é difícil entender essa aversão, pois o que ouvimos é uma peça atmosférica e hipnótica, quase uma viagem espiritual, com coro, orquestra e a banda em perfeita sincronia. Trata-se de uma composição genuinamente progressiva, cheia de camadas que se desenrolam lentamente, arrastando o ouvinte para um estado de contemplação quase meditativa. O teclado de Richard Wright, sombrio e denso, estabelece o tom, enquanto as linhas simples, porém eficazes, do baixo de Roger Waters complementam as guitarras distintivas de David Gilmour. A orquestração e o coro conferem uma majestade clássica à peça, com vocalizações que vão desde o coral tradicional até cânticos que lembram a musicalidade maori. A faixa muda de humor ao longo do tempo, passando de uma atmosfera mais melancólica para um groove descontraído, sempre mantendo elementos de efeitos sonoros que evocam cenários enigmáticos. Enxergar essa composição como ambiciosa e talvez pretensiosa é comum, mas a verdade é que o Pink Floyd conseguiu algo grandioso, e pessoalmente, não entendo a razão para o desprezo da banda por ela.

“If” abre a segunda metade do disco com uma tranquilidade quase necessária, após o caos orquestral da faixa anterior. Talvez seja a faixa mais fraca do álbum, mas ainda assim tem seu valor, proporcionando uma pausa relaxante. A simplicidade do violão de Waters, somada às sutis intervenções de Gilmour na guitarra, oferece um respiro bem-vindo, ainda que sem grandes inovações. Em seguida, “Summer '68” traz à tona um dos pianos mais expressivos de Richard Wright, dramático e belo ao longo de toda a faixa. Wright também assume os vocais, dando início a uma melodia suave que se intensifica após o primeiro refrão, com instrumentos de sopro e cordas contribuindo para a grandiosidade. A letra, que parece descrever de maneira amarga uma relação passageira, talvez com uma groupie, contrasta um pouco com a instrumentação, mas a música em si permanece forte e marcante.

“Fat Old Sun”, precedida por suaves badaladas de sino, começa de maneira tranquila e remete ao tom relaxado de “If”. Essa faixa, no entanto, foi resgatada por Gilmour em suas performances solo a partir de 2007 e nunca mais saiu de seu repertório. Seus vocais são suaves e melódicos, e o solo de guitarra no final é uma verdadeira obra de arte, tornando essa música uma joia discreta do álbum. Por fim, “Alan's Psychedelic Breakfast” é, sem dúvida, a peça mais vanguardista e experimental do disco. Aqui, somos apresentados ao som de um homem – Alan Styles, roadie da banda – preparando seu café da manhã, com reflexões descontraídas sobre o tema. Sem elementos tradicionais de rock, a faixa é dividida em três partes: “Rise And Shine”, dominada por um piano suave; “Sunny Side Up”, onde Gilmour traz belos acordes de violão; e “Morning Glory”, que envolve todos os membros da banda em um encerramento sereno, finalizado com o som de uma torneira pingando.

Atom Heart Mother pode não ser o maior feito do Pink Floyd, e sua estrutura talvez não tenha sido tão cuidadosamente planejada quanto os discos icônicos que viriam depois. No entanto, seu valor reside em sua ousadia e no seu caráter experimental, principalmente na faixa-título. Não se trata de um álbum essencial, mas é, sem dúvida, uma peça interessante e digna de figurar em qualquer coleção de fãs de rock progressivo ou da banda.

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Atom Heart Mother marks a fundamental transition point in Pink Floyd's sound, emerging from their more experimental and psychedelic phase into something more cohesive and contained. This album is a valuable and intriguing piece in the band's discography. The title track, for instance, is a true sonic epic of nearly 24 minutes, blending the band's instrumental prowess with sophisticated orchestration crafted by Ron Geesin. While many bands would adopt the fusion of rock with symphonic elements in later years, Pink Floyd was one of the pioneers of this style, creating, for some, a masterpiece; for others, a bold and unnecessary attempt. But the truth is, this is an album that can be appreciated without needing to adhere to extremes of worship or rejection.

The album opens with the title track, a source of discomfort for the band itself, which claims not to like the outcome. However, it’s hard to understand this aversion, as what we hear is an atmospheric and hypnotic piece, almost a spiritual journey, with choir, orchestra, and band in perfect sync. It is a genuinely progressive composition, full of layers that slowly unfold, dragging the listener into an almost meditative state of contemplation. Richard Wright's keyboards, dark and dense, set the tone, while Roger Waters' simple yet effective bass lines complement David Gilmour's distinctive guitars. The orchestration and choir lend a classical majesty to the piece, with vocalizations ranging from traditional chorale to chants reminiscent of Maori musicality. The track shifts mood over time, moving from a more melancholic atmosphere to a laid-back groove, always maintaining sound effects that evoke enigmatic scenarios. Seeing this composition as ambitious and perhaps pretentious is common, but the truth is that Pink Floyd achieved something grand, and personally, I don’t understand the band's disdain for it.

“If” opens the second half of the album with an almost necessary calm after the orchestral chaos of the previous track. It might be the weakest track on the album, but it still holds value, providing a relaxing break. Waters' acoustic guitar simplicity, combined with Gilmour's subtle guitar interventions, offers a welcome breather, though without major innovations. Then, "Summer '68" brings forth one of Richard Wright's most expressive pianos, dramatic and beautiful throughout. Wright also takes on vocal duties, starting with a gentle melody that intensifies after the first chorus, with brass and strings adding to the grandeur. The lyrics, which seem to bitterly describe a fleeting relationship, perhaps with a groupie, contrast a bit with the instrumentation, but the music itself remains strong and memorable.

“Fat Old Sun,” preceded by gentle bell chimes, begins calmly and echoes the relaxed tone of “If.” However, this track was revived by Gilmour in his solo performances starting in 2007 and has remained in his repertoire ever since. His vocals are smooth and melodic, and the guitar solo at the end is a true masterpiece, making this song a hidden gem on the album. Finally, “Alan's Psychedelic Breakfast” is undoubtedly the album’s most avant-garde and experimental piece. Here, we're introduced to the sound of a man – Alan Styles, the band’s roadie – preparing his breakfast, with laid-back reflections on the theme. Lacking traditional rock elements, the track is divided into three parts: “Rise And Shine,” dominated by gentle piano; “Sunny Side Up,” where Gilmour delivers beautiful acoustic guitar chords; and “Morning Glory,” involving all the band members in a serene conclusion, finishing with the sound of a dripping faucet.

Atom Heart Mother may not be Pink Floyd's greatest achievement, and its structure may not have been as carefully planned as the iconic albums that followed. However, its value lies in its boldness and experimental nature, especially in the title track. It may not be an essential album, but it is undoubtedly an interesting piece, deserving a place in any progressive rock or Pink Floyd fan’s collection.

NOTA: 8/10

Tracks Listing

1. Atom Heart Mother (23:51)
2. If (4:24)
3. Summer '68 (5:26)
4. Fat Old Sun (5:17)
5. Alan's Psychedelic Breakfast (12:56)

Ouça, "Atom Heart Mother"




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