Steve Hackett - Spectral Mornings (1979)

 

A essa altura da carreira, Steve Hackett, um dos meus maiores ídolos, consolidava-se firmemente como um músico solo de renome. Sua saída do Genesis, dois anos antes, provou ser uma decisão acertada, especialmente pelo sucesso alcançado com seu segundo álbum, Please Don't Touch. Contudo, Spectral Mornings não foi apenas mais um disco bem-sucedido, mas uma de suas obras mais significativas e duradouras. O álbum explora uma variedade impressionante de estilos musicais, fundindo-os de maneira magistral para criar uma experiência sonora rica e diversificada. Neste trabalho, Hackett finalmente teve a liberdade de expressar plenamente todo o seu talento, algo que ele não podia fazer enquanto esteva no Genesis. Ele pôde, enfim dar vazão aos seus solos, explorar faixas acústicas e exibir suas seções de guitarra elétrica de maneira mais ousada e criativa, resultando em uma obra complexa e sofisticada.

Embora seja o terceiro álbum solo de Hackett, Spectral Mornings é muitas vezes considerado o primeiro verdadeiramente "seu". Alguns argumentam que em sua estreia ele contou com a valiosa ajuda de Phil Collins e Mike Rutherford, e que em Please Don't Touch foi apoiado por músicos de peso como Ritchie Havens, Phil Ehart, Steve Walsh e Chester Thompson. Isso fez com que muitos ainda duvidassem da capacidade de Hackett de se destacar por conta própria. Esse álbum, no entanto, veio para silenciar qualquer ceticismo. Composto quase exclusivamente por Hackett e sua banda—formada por seu irmão e um grupo de músicos sólidos, mas relativamente desconhecidos—Spectral Mornings apresenta uma coleção de faixas equilibradas, onde nenhuma delas soa como mero preenchimento ou é considerada fraca. Os sons vão desde o rock progressivo complexo até faixas de inspiração japonesa e trilhas acústicas de uma beleza impressionante, mantendo a qualidade sempre em altíssimo nível.

O disco abre com "Every Day", certamente uma das melhores composições de Hackett em toda a sua carreira. A música é consistente, complexa e repleta de mudanças dinâmicas. Acredito que essa seja a faixa em que Hackett mais se aproxima do estilo que apresentou em seus dias com o Genesis, dando bastante ênfase às atmosferas e misturando a guitarra com os teclados de Nick Magnus, que lembram, de certa forma, o estilo de Tony Banks. É uma daquelas canções em que absolutamente tudo é perfeito.

"The Virgin And The Gypsy" é uma música delicada, com um suave violão de 12 cordas e vocais multi-harmonizados. O interlúdio instrumental de flauta é igualmente belo e adiciona uma camada sombria e introspectiva à canção. É uma das músicas favoritas de Hackett, e ele frequentemente a inclui em seus concertos. "The Red Flower Of Tachai Blooms Everywhere" destaca-se por sua sonoridade oriental, onde Hackett toca koto—um instrumento japonês de cordas com um som bastante característico—de forma impressionante. A atmosfera da faixa é complementada pelo trabalho espiritual de Mellotron de Magnus. A música é curta o suficiente para manter sua originalidade e encanto do início ao fim."Clocks - The Angel Of Mons" é outra das faixas instrumentais do álbum. Forte, atmosférica e extremamente sombria, a música vai além do notório trabalho de guitarra de Hackett, destacando também a solidez de John Shearer na bateria, que inclui um momento solo marcante.

Já me deparei com algumas pessoas que apreciam esse álbum, mas que não gostam muito de "The Ballad Of The Decomposing Man". Sinceramente, não só aprecio, como adoro essa música. Ela começa como algo gravado nas duas primeiras décadas do século XX, com um forte toque de vaudeville. É importante lembrar que essa abordagem, de uma canção que parece fora de lugar e com um ar cômico, não era nenhuma novidade—músicas como "Seaside Rendezvous" do Queen e "Jeremy Bender" e "The Sheriff" do Emerson Lake & Palmer são exemplos anteriores. Neste caso, Hackett adiciona toques de ragtime e jazz primitivo, criando uma sonoridade agradável e inesperada. Para completar, a música surpreende ao inserir uma sonoridade caribenha antes do final. Uma mistura intrigante de sons, estilos e influências peculiares, mas que no final das contas funcionou muito bem.

Em "Lost Time in Cordoba", Hackett mostra suas habilidades como guitarrista clássico/acústico. A faixa é extremamente bonita e evidencia o óbvio: Steve Hackett é para mim o melhor artista de guitarra acústica em todo o rock progressivo. O trabalho é dinâmico e cheio de energia. Destaque também para as linhas flutuantes de flauta, magistralmente compostas por John Hackett"Tigermoth" é uma faixa sensacional, com uma atmosfera obscura que poderia facilmente ter saído do álbum de estreia de Hackett, Voyage of the Acolyte, embora soe um pouco mais deprimente, ou melhor dizendo, nostálgica. A música começa com um riff pesado, ótimo trabalho de mellotron e uma dinâmica excelente entre baixo e bateria. Hackett, como sempre, brilha na guitarra. Quando os vocais entram, eles evocam o sentimento melancólico de um pai indo à guerra e não voltando.

Spectral Mornings chega ao fim com a faixa-título, trazendo uma sensação diferente ao álbum, em contraste com sua introdução. Esse é o momento que mais lembra seus tempos no Genesis; a banda quase recria algo dos quatro álbuns da era de Hackett no grupo. Nick Magnus novamente entrega linhas de teclado que remetem ao estilo de Tony Banks, enquanto Dick Cadbury assume um papel semelhante ao de Mike Rutherford, só que mais obscuro, e a semelhança entre a bateria de John Shearer e a de Phil Collins é impressionante, quase uma homenagem. Um final perfeito para um álbum sensacional.

Spectral Mornings é o disco ideal para recomendar a alguém que está começando a explorar a carreira solo de Steve Hackett. Um verdadeiro caldeirão de composições maravilhosas, atmosfera cativante e diversidade sempre interessante.

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At this point in his career, Steve Hackett, one of my greatest idols, was firmly establishing himself as a renowned solo musician. His departure from Genesis two years earlier proved to be a wise decision, especially with the success of his second album, Please Don't Touch. However, Spectral Mornings was not just another successful album but one of his most significant and enduring works. The album explores an impressive variety of musical styles, blending them masterfully to create a rich and diverse sonic experience. In this work, Hackett finally had the freedom to fully express his talent, something he couldn't do while in Genesis. He was finally able to unleash his solos, explore acoustic tracks, and showcase his electric guitar sections in a bolder and more creative manner, resulting in a complex and sophisticated piece.

Although it is Hackett's third solo album, Spectral Mornings is often considered his first truly "own" album. Some argue that in his debut, he relied on the valuable help of Phil Collins and Mike Rutherford, and that in Please Don't Touch, he was supported by heavyweight musicians like Ritchie Havens, Phil Ehart, Steve Walsh, and Chester Thompson. This led many to still doubt Hackett's ability to stand out on his own. However, this album came to silence any skepticism. Composed almost entirely by Hackett and his band—formed by his brother and a group of solid but relatively unknown musicians—Spectral Mornings presents a collection of balanced tracks, where none of them feel like mere filler or are considered weak. The sounds range from complex progressive rock to Japanese-inspired tracks and stunningly beautiful acoustic pieces, maintaining the quality at an extremely high level.

The album opens with "Every Day", certainly one of Hackett's best compositions throughout his career. The music is consistent, complex, and full of dynamic changes. I believe this is the track where Hackett most closely aligns with the style he presented during his days with Genesis, placing great emphasis on atmospheres and blending the guitar with Nick Magnus's keyboards, which in some ways resemble Tony Banks's style. It is one of those songs where absolutely everything is perfect.

"The Virgin And The Gypsy" is a delicate song with a soft 12-string guitar and multi-harmonized vocals. The instrumental flute interlude is equally beautiful and adds a somber and introspective layer to the song. It is one of Hackett's favorite songs, and he often includes it in his concerts. "The Red Flower Of Tachai Blooms Everywhere" stands out for its oriental sound, where Hackett impressively plays the koto—a Japanese string instrument with a very distinctive sound. The track's atmosphere is complemented by Magnus's spiritual Mellotron work. The song is short enough to maintain its originality and charm from start to finish. "Clocks - The Angel Of Mons" is another of the album's instrumental tracks. Strong, atmospheric, and extremely dark, the song goes beyond Hackett's notable guitar work, also highlighting John Shearer's solid drumming, which includes a striking solo moment.

I have encountered some people who appreciate this album but are not very fond of "The Ballad Of The Decomposing Man". Honestly, I not only appreciate but love this song. It begins as something recorded in the first two decades of the 20th century, with a strong touch of vaudeville. It is important to remember that this approach, of a song that seems out of place and has a comedic air, was nothing new—songs like Queen's "Seaside Rendezvous" and Emerson, Lake & Palmer's "Jeremy Bender" and "The Sheriff" are earlier examples. In this case, Hackett adds touches of ragtime and early jazz, creating a pleasant and unexpected sound. To top it off, the song surprises by inserting a Caribbean sound before the end. An intriguing mix of sounds, styles, and peculiar influences, but in the end, it worked very well.

In "Lost Time in Cordoba", Hackett showcases his skills as a classical/acoustic guitarist. The track is extremely beautiful and highlights the obvious: Steve Hackett is, to me, the best acoustic guitar artist in all of progressive rock. The work is dynamic and full of energy. Also noteworthy are the floating flute lines, masterfully composed by John Hackett. "Tigermoth" is an amazing track, with a dark atmosphere that could easily have come from Hackett's debut album, Voyage of the Acolyte, though it sounds a bit more depressing, or rather, nostalgic. The song begins with a heavy riff, excellent Mellotron work, and an excellent dynamic between bass and drums. Hackett, as always, shines on the guitar. When the vocals come in, they evoke the melancholy feeling of a father going to war and not returning.

Spectral Mornings ends with the title track, bringing a different feeling to the album, in contrast to its introduction. This is the moment that most resembles his time in Genesis; the band almost recreates something from the four albums of the Hackett era in the group. Nick Magnus once again delivers keyboard lines reminiscent of Tony Banks's style, while Dick Cadbury takes on a role similar to Mike Rutherford's, only darker, and the similarity between John Shearer's drumming and Phil Collins's is impressive, almost a tribute. A perfect ending to a sensational album.

Spectral Mornings is the ideal album to recommend to someone who is just beginning to explore Steve Hackett's solo career. A true melting pot of wonderful compositions, captivating atmosphere, and always interesting diversity.

NOTA: 9.5/10

Tracks Listing

1. Every Day (6:14)
2. The Virgin and the Gypsy (4:28)
3. The Red Flower of Tachai Blooms Everywhere (2:05)
4. Clocks (The Angel of Mons) (4:16)
5. The Ballad of the Decomposing Man (featuring "The Office Party") (3:48)
6. Lost Time in Cordoba (4:03)
7. Tigermoth (7:35)
8. Spectral Mornings (6:32)

Ouça, "Every Day"



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