Genesis – Trespass (1970)

 

A transição do Genesis de seu álbum de estreia, From Genesis to Revelation, para Trespass é um dos momentos mais notáveis na história do rock progressivo. Creio que nenhuma outra banda conseguiu realizar uma mudança tão radical em tão pouco tempo, e esse salto qualitativo é evidente em cada faixa do álbum. O disco é muito mais consistente, cativante e envolvente, representando o verdadeiro início da jornada progressiva da banda.

A ausência de Steve Hackett pode surpreender aqueles que conhecem bem a discografia da banda, mas o trabalho de Anthony Phillips é tão impressionante que muitos poderiam facilmente acreditar que Hackett já fazia parte do grupo. Phillips desenvolve aqui um estilo de guitarra que seria emblemático para a sonoridade da banda em seus álbuns seguintes. Se não fosse a aversão de Phillips aos palcos, talvez nunca tivéssemos visto Hackett como membro do Genesis. Por outro lado, a substituição de John Mayhew por Phil Collins era inevitável. Mayhew, apesar de competente, não conseguia acompanhar a grandiosidade que o grupo estava alcançando. Collins, com seu talento e carisma, era mais adequado às novas ambições da banda.

Embora as habilidades vocais de Peter Gabriel ainda estivessem em desenvolvimento, ele já demonstrava grande energia e clareza em sua performance. Tony Banks entrega um trabalho notável de teclado, e Mike Rutherford, como sempre, é preciso em suas linhas de baixo. O álbum traz uma sonoridade obscura, agressiva e atmosférica, elementos que se tornariam marcas registradas da banda e razões pelas quais o Genesis ocupa um lugar especial entre os gigantes do rock progressivo.

Trespass inicia-se com "Looking For Someone", uma faixa que exemplifica bem essa nova direção musical. A voz de Gabriel abre a música de forma intensa, com o órgão criando uma atmosfera densa até que os outros instrumentos se juntam em uma excelente combinação de passagens serenas e momentos de maior intensidade. O trabalho de guitarra de Phillips é um dos destaques, mostrando afinações que seriam exploradas nos futuros álbuns da banda.

"White Mountain" segue com uma narrativa de conto de fadas, contando a história de um lobo solitário que desafia as normas de sua sociedade e paga um preço alto por isso. A faixa, embora subestimada por muitos, é um exemplo brilhante da habilidade da banda em criar atmosferas e contar histórias através de sua música. A guitarra acústica de Phillips e os teclados de Banks, junto com a melodia vocal de Gabriel, resultam em uma experiência sonora imersiva e arrebatadora. "Visions of Angels" traz elementos que parecem unir o passado e o futuro da banda. Apesar de ser uma faixa um pouco mais tradicional em sua estrutura, há momentos de grande intensidade que mostram a capacidade do Genesis de transformar uma melodia simples em algo grandioso e emocionalmente envolvente.

"Stagnation" é um exemplo do mundo imaginativo do grupo. A faixa explora as reflexões de um homem que escolheu viver em um abrigo subterrâneo, e a combinação das guitarras de doze cordas, vocais serenos e teclados inventivos cria uma atmosfera pastoral e ao mesmo tempo épica. O final é uma explosão apoteótica que culmina em um dos momentos mais entusiasmantes do álbum. "Dusk" é uma faixa mais leve e melódica, com letras que exploram o amor e o significado da vida. É a faixa mais pop do álbum, sem bateria, e com uma estrutura mais suave e delicada. As guitarras acústicas e a flauta de Gabriel contribuem para a atmosfera serena e introspectiva da peça.

"The Knife" encerra o disco de forma magistral, uma faixa que encapsula a essência do rock progressivo em sua forma mais dinâmica e intensa. A guitarra de Phillips e o órgão de Banks criam uma parede de som que é ao mesmo tempo poderosa e complexa. Mayhew, em sua despedida, entrega uma performance rítmica cheia de groove e intensidade, enquanto Gabriel canta com uma paixão visceral. "The Knife" é um triunfo que destaca o Genesis como uma força emergente no cenário do rock progressivo, uma faixa que se mantém como uma das mais emocionantes e poderosas da carreira da banda.

Trespass é um álbum excelente, que marca o momento em que a banda atingiu sua maturidade musical, apesar da juventude de seus membros. É um disco que merece muito mais reconhecimento do que recebe, sendo um marco na história do rock progressivo e na evolução do grupo como uma das bandas mais importantes do gênero.

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The transition from Genesis' debut album, From Genesis to Revelation, to Trespass is one of the most remarkable moments in the history of progressive rock. Few bands have managed such a radical shift in so little time, and this qualitative leap is evident in every track of the album. Trespass is far more consistent, captivating, and engaging, marking the true beginning of the band's progressive journey.

The absence of Steve Hackett may surprise those familiar with the band's discography, but Anthony Phillips' work is so impressive that many might easily believe Hackett was already part of the group. Phillips develops here a guitar style that would become emblematic of the band's sound in future albums. Had Phillips not been averse to the stage, we might never have seen Hackett join Genesis. On the other hand, the replacement of John Mayhew by Phil Collins was inevitable. Mayhew, though competent, could not match the grandeur the band was achieving. Collins, with his talent and charisma, was better suited to the band's new ambitions.

Although Peter Gabriel's vocal skills were still developing, he already demonstrated great energy and clarity in his performance. Tony Banks delivers a notable keyboard performance, and Mike Rutherford, as always, is precise in his bass lines. The album features a dark, aggressive, and atmospheric sound—elements that would become hallmarks of the band and reasons why Genesis holds a special place among the giants of progressive rock.

Trespass opens with "Looking for Someone", a track that exemplifies this new musical direction. Gabriel's voice starts the song intensely, with the organ creating a dense atmosphere until the other instruments join in, offering an excellent blend of serene passages and more intense moments. Phillips' guitar work is a highlight, showcasing tunings that would be explored in the band's future albums.

"White Mountain" follows with a fairy-tale narrative, telling the story of a solitary wolf who defies the norms of his society and pays a high price for it. Although often underrated, this track is a brilliant example of the band's ability to create atmospheres and tell stories through their music. Phillips' acoustic guitar and Banks' keyboards, along with Gabriel's vocal melody, result in an immersive and captivating listening experience.

"Visions of Angels" brings elements that seem to bridge the past and future of the band. Although it is a somewhat more traditional track in its structure, there are moments of great intensity that show Genesis' ability to transform a simple melody into something grand and emotionally engaging.

"Stagnation" is a glimpse into the group's imaginative world. The track explores the reflections of a man who chooses to live in an underground shelter, and the combination of twelve-string guitars, serene vocals, and inventive keyboards creates a pastoral yet epic atmosphere. The ending is a dramatic crescendo, culminating in one of the album's most exhilarating moments.

"Dusk" is a lighter, more melodic track, with lyrics that explore love and the meaning of life. It is the album's most pop-oriented song, without drums, and with a softer, more delicate structure. The acoustic guitars and Gabriel's flute contribute to the serene and introspective atmosphere of the piece.

"The Knife" concludes the album in a masterful way, encapsulating the essence of progressive rock in its most dynamic and intense form. Phillips' guitar and Banks' organ create a wall of sound that is both powerful and complex. Mayhew, in his farewell performance, delivers a rhythmically rich and intense performance, while Gabriel sings with visceral passion. "The Knife" stands as a triumph, showcasing Genesis as an emerging force in the progressive rock scene, and remains one of the band's most exciting and powerful tracks.

Trespass is an excellent album that marks the moment when the band reached its musical maturity, despite the youth of its members. It is a record that deserves much more recognition than it receives, being a milestone in the history of progressive rock and in the evolution of the group as one of the genre's most important bands.

NOTA: 9/10

Tracks Listing:

1. Looking for Someone (7:06)
2. White Mountain (6:42)
3. Visions of Angels (6:50)
4. Stagnation (8:48)
5. Dusk (4:13)
6. The Knife (8:56)

Ouça, "The Knife"



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