Animals é um dos álbuns mais marcantes da discografia do Pink Floyd, e não apenas pelo som ou pelas letras intensas, mas também pelo contexto em que foi concebido. Roger Waters, o principal arquiteto do trabalho, direciona as composições para uma crítica social feroz, inspirada em A Revolução dos Bichos, o célebre livro de George Orwell publicado em 1945. Em vez de adotar uma postura puramente individualista e niilista, Waters canaliza suas frustrações em uma narrativa politicamente carregada, onde as três faixas centrais do álbum representam diferentes classes na hierarquia política.
A primeira dessas faixas, "Dogs" retrata os manipuladores implacáveis, enquanto "Pigs" critica os gananciosos que detêm o poder, e "Sheep" aborda os seguidores passivos que embora oprimidos, eventualmente se revoltam contra seus opressores. O conceito é poderoso e sombrio, refletindo um desencanto profundo com a sociedade.
Musicalmente, Animals é um dos álbuns mais agressivos da banda, e por isso, costumo chamá-lo de o disco mais “punk rock” do Pink Floyd. Essa agressividade, contudo, não se traduz em uma ruptura com o estilo que fez a fama do grupo. Pelo contrário, o álbum mantém a identidade floydiana intacta, o que explica por que, mesmo com sua ferocidade, Animals é frequentemente citado como um dos favoritos pelos fãs.
A capa do álbum merece uma menção especial. A imagem do porco inflável pairando entre as torres da Battersea Power Station em Londres tornou-se um ícone cultural, encapsulando o surrealismo e a crítica social que permeiam o álbum. Para muitos, a arte de Animals é a mais emblemática de todas as capas do Pink Floyd, uma verdadeira obra de arte visual que complementa a música de maneira perfeita.
O álbum começa com "Pigs on the Wing Part 1", uma faixa semi-acústica que serve como uma introdução suave, porém carregada de dor e introspecção. A simplicidade melódica contrasta com a profundidade das letras, que já apontam para o crescente controle criativo de Waters sobre a banda. Esse controle se manifesta de maneira ainda mais evidente em "Dogs" a peça central do álbum. Com seus 17 minutos, a faixa é um épico que combina solos de guitarra arrebatadores de David Gilmour, letras inteligentes e uma estrutura que alterna entre momentos de calmaria e tensão, mas sem jamais perder a fluidez. É um dos momentos mais brilhantes de toda a carreira da banda, uma síntese perfeita de tudo o que eles haviam conquistado até então.
"Pigs (Three Different Ones)" segue com uma veia hard rock, porém, envolta na atmosfera psicodélica característica da banda. As letras são afiadas, repletas de sarcasmo e críticas políticas, enquanto Gilmour entrega um dos solos de guitarra mais inspirados de sua carreira, um momento que se destaca em meio a tantas obras-primas. Em "Sheep" a agressividade atinge seu ápice. As massas são descritas de forma impiedosa, como seguidores cegos e medrosos e que vivem apenas para sobreviver. Musicalmente, a peça é um tour de force, com o baixo pulsante de Waters, os teclados imersivos de Richard Wright, e uma performance final de Gilmour que eleva a música a um patamar sublime. O álbum se encerra com "Pigs on the Wing Part 2" uma retomada da primeira faixa, mas agora com uma nuance diferente nas letras, que expressam um pouco mais de otimismo, ou pelo menos, uma resignação menos amarga.
Particularmente, considero que Animals é o último grande álbum do Pink Floyd, aquele que ainda carrega a centelha de genialidade que os tornou uma das bandas mais inovadoras de todos os tempos. Embora The Wall tenha seu lugar incontestável na história, Animals é em muitos aspectos o último suspiro de uma era de criatividade pura e irrestrita. Mas essa é uma discussão para outra resenha.
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Animals is one of the most striking albums in Pink Floyd's discography, and not just because of its sound or intense lyrics, but also due to the context in which it was conceived. Roger Waters, the primary architect of the work, channels his frustrations into a politically charged narrative inspired by George Orwell's 1945 book Animal Farm. Instead of adopting a purely individualistic and nihilistic stance, Waters uses the album to deliver a fierce social critique, where the three central tracks represent different classes within the political hierarchy.
The first of these tracks, "Dogs", depicts the ruthless manipulators, while "Pigs" criticizes the greedy power holders, and "Sheep" addresses the passive followers who, despite being oppressed, eventually revolt against their oppressors. The concept is powerful and dark, reflecting a deep disillusionment with society.
Musically, Animals is one of the band's most aggressive albums, which is why I often refer to it as Pink Floyd's most "punk rock" record. This aggression, however, does not translate into a break from the style that made the band famous. On the contrary, the album maintains the quintessential Floydian identity, which explains why, despite its ferocity, Animals is frequently cited as one of the fans' favorites.
The album cover deserves special mention. The image of the inflatable pig floating between the towers of Battersea Power Station in London has become a cultural icon, encapsulating the surrealism and social critique that permeate the album. For many, the artwork of Animals is the most emblematic of all Pink Floyd covers, a true visual masterpiece that perfectly complements the music.
The album begins with "Pigs on the Wing Part 1", a semi-acoustic track that serves as a gentle introduction, yet is laden with pain and introspection. The melodic simplicity contrasts with the depth of the lyrics, which already point to Waters' increasing creative control over the band. This control is even more evident in "Dogs", the centerpiece of the album. At 17 minutes, the track is an epic that combines David Gilmour's breathtaking guitar solos, intelligent lyrics, and a structure that alternates between calm and tension without ever losing its flow. It is one of the brightest moments in the band's entire career, a perfect synthesis of everything they had achieved up to that point.
"Pigs (Three Different Ones)" follows with a hard rock vein, yet enveloped in the band's characteristic psychedelic atmosphere. The lyrics are sharp, filled with sarcasm and political criticism, while Gilmour delivers one of the most inspired guitar solos of his career, a standout moment among many masterpieces. "In "Sheep", the aggression reaches its peak. The masses are described mercilessly as blind and fearful followers who live merely to survive. Musically, the piece is a tour de force, with Waters' pulsating bass, Richard Wright's immersive keyboards, and a final performance by Gilmour that elevates the music to a sublime level. The album concludes with "Pigs on the Wing Part 2" a reprise of the first track, but now with a slightly different nuance in the lyrics, expressing a bit more optimism, or at least a less bitter resignation.
Personally, I consider Animals to be the last great album by Pink Floyd, still carrying the spark of genius that made them one of the most innovative bands of all time. Although The Wall has its undisputed place in history, Animals is, in many respects, the last breath of a pure and unrestricted era of creativity. But that's a discussion for another review.
NOTA: 10/10
Tracks
Listing:
1.
Pigs on the Wing, Part 1 (1:25)
2. Dogs (17:04)
3. Pigs (Three Different Ones) (11:28)
4. Sheep (10:16)
5. Pigs on the Wing, Part 2 (1:25)
Ouça, "Dogs"
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